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PIECES OF A WOMAN MIRA NO OSCAR

Nietzsche disse uma vez que “ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu.” E foram essas as palavras que me ocorreram quando estava por terminar o novo filme da Netflix “Pieces Of a Woman”. Em sua primeira meia hora, somos brevemente apresentados ao casal Martha (Vanessa Kirby) e Sean (Shia LaBeouf), que estão vivendo a espera do nascimento de sua primeira filha. 

A hora do parto vem rápida, mas acaba se revelando intensa em sua demora. A cena dura aproximadamente 25 minutos. O parto, doméstico, é filmado sem cortes. A dor e a ansiedade naturais da ocasião são tangíveis e criam uma atmosfera de intimidade entre o público e os protagonistas. Kornél Mundruczó, o diretor, soma ao clima intimista sua exímia competência técnica ao transitar com a câmera pela casa, percorrendo os cômodos e construindo um incômodo tenso sem igual ao descolar-se entre Martha, Sean e a parteira (Molly Parker). 

Entramos na casa. Estamos presentes naquele momento. O ritmo inquietante da cena atinge o âmago da angústia quando o desespero da parteira alerta para a tragédia anunciada. A pequena Yvett, que vivera apenas por breves segundos, está morta. E a partir de então, a dimensão visceral das emoções que domina o primeiro ato, se prolonga por toda a extensão do filme. 

A brutalidade da perda resulta em terríveis desdobramentos, especialmente para Martha, cuja jornada emocional no luto é marcada por uma dor profunda e silenciosa. Devido ao fato de construir sua dor no silêncio, Martha lida com os ecos desse sentimento de forma diferente dos demais afetados pela tragédia, o que estremece a relação com seu núcleo afetivo, confrontado pela sua introspecção. 

Sean, por outro lado, regressa ao alcoolismo e demonstra falta de tato para lidar com Martha através de atitudes que transparecem insensibilidade, à exemplo da cena em que se manifesta interessado em resgatar a relação sexual com sua esposa. Os diferentes impactos da perda é um aspecto abordado em muitas camadas e trabalhado com sensibilidade ao evidenciar o óbvio: cada dor é única e cada luto é particular. E aqui volto à frase de Nietzsche: a ponte para atravessar o luto é uma construção individual. 

Por fim, não tem como deixar de falar da interpretação magistral de Vanessa Kirby, que enriquece a subjetividade fílmica ao explorar brilhantemente todas as nuances das emoções expressadas. Nome quase certo no Oscar, Vanessa entrega uma performance impressionante e destemida. You go, girl! 

 

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