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Existe vida fora das redes sociais?

As redes sociais possuem grande influência na vida das pessoas e o uso delas já é tão natural quanto comer ou dormir. Afinal, quantas horas em média você passa conectado? Quantas curtidas podem ser dadas durante um dia? Ou quantas vidas são possíveis conhecer com poucos cliques? Em contrapartida, quanta estranheza é causada quando alguém diz que não usa redes sociais? 

De acordo com um relatório divulgado em abril pela We Are Social e a HootSuite, em 2022 o brasileiro passa em média 3 horas e 47 minutos por dia nas redes sociais, ficando atrás apenas dos nigerianos, dos filipinos e dos sul-africanos por poucos minutos. Durante o ano, esse tempo deve ficar ainda maior, influenciado, principalmente, pelo uso do TikTok, que hoje é a quinta rede social mais usada no Brasil. 

Um cenário que contribuiu bastante para esse crescimento foi a pandemia da Covid-19, quando o consumo de informações dentro das mídias digitais cresceu exponencialmente. No entanto, a pandemia também incentivou um outro movimento: as pessoas que precisaram se afastar das redes sociais durante o período de isolamento. “No final de 2020 eu tive um período muito difícil na minha vida no quesito emocional. Eu tive depressão, nunca tinha passado por uma situação como essa,  e quando eu vi as pessoas nas redes sociais, as pessoas felizes, as pessoas bem, eu tinha raiva de tudo aquilo, então eu decidi me distanciar e ficar mais na minha. Eu comentava com as pessoas perto de mim que a felicidade das pessoas no Instagram me deixava triste. Isso acabava afetando elas também de forma negativa, eu acabava puxando todo mundo para o fundo do poço junto comigo”, conta Beatriz Pimenta. 

Beatriz Pimenta. Foto: reprodução.

Apesar da decisão, Beatriz não pôde se afastar completamente por causa da profissão, como publicitária, ela precisava continuar acessando o Instagram para trabalhar. A solução foi deslogar a conta do seu perfil pessoal, mas ainda era difícil lidar com a curiosidade e a sensação de que estava perdendo algo por não estar na rede. “É um vício, eu percebi que é muito complicado. Eu passei duas semanas desesperada, tentando acessar de todas as formas, mas eu me segurei, e com um mês eu já não sentia falta. Foi algo muito difícil no começo, mas logo em seguida eu me acostumei”, compartilha. 

Superando os dias iniciais, Beatriz conseguiu ficar seis meses longe do Instagram, até se sentir pronta para voltar a acessar o seu perfil pessoal e também lidar com a rede de uma forma diferente, o que também ajudou em seu trabalho. “Esses seis meses que eu fiquei sem redes sociais ajudou bastante para eu voltar, me tratar e tratar meus clientes de uma forma melhor, porque eu não estava vendo aquilo que estava me atingindo. Foi muito bom esse detox e de tempos em tempos, quando eu estou muito ansiosa, eu penso em fazer isso novamente”, conclui. 

Assim como Beatriz, a jornalista Pietra Geórgia também notou que precisava dar um tempo das redes sociais durante a pandemia, já que ela sentia que a “a vida não saia das telas”. Em uma guerra entre o estar presente nas redes sociais ou viver mais presente no mundo real, ela decidiu que hora de se desprender das mídias. “A minha vida era basicamente isso, porque na pandemia eu fiquei muito tempo em casa, então a única coisa que eu fazia era usar as redes sociais, eu decidi apagar e dizer ‘eu preciso viver a vida fora das telas’, então foi isso que me levou, essa vontade de viver o real. Era coisa do tipo eu sair com os meus amigos, está com os meus pais e estar no celular o tempo todo, tá mexendo 24 horas no Instagram, sem nem ter motivo para estar mexendo”, conta. 

Mesmo sabendo que era aquilo que precisava fazer, o período de adaptação não foi fácil. Diversas vezes Pietra pegava no celular e “ficava sem ter onde mexer”, até que ela mesma se obrigava a largar o aparelho e buscava outras coisas para fazer. Aos poucos, Pietra foi descobrindo que gostava de fazer muitas outras coisas que não envolvessem o celular. “Eu pude me conectar comigo, eu senti que eu estava 100% nos locais onde eu me propus a estar. Se eu tava conversando com a minha mãe, eu tava conversando com a minha mãe, eu tava ali por inteiro. Se eu tava lendo um livro, eu tava lendo um livro por inteiro. Foi um período incrível, onde eu me conectei comigo mesma, me conectei mais com os meus pais, com os meus amigos, mais com os meus hobbys.”

Pietra Geórgia. Foto: reprodução.

Enquanto Pietra curtia essa nova fase, a decisão causava estranheza em outras pessoas. “Uma coisa muito engraçada que aconteceu foi quando eu desativei minha conta e não avisei para ninguém, tomei minha decisão, eu não precisava informar para ninguém. Eu recebia tanta mensagem de gente perguntando se eu estava bem, se tinha acontecido alguma coisa e era engraçado esse movimento das pessoas perto de mim, porque elas ficavam sem entender, achavam loucura”, relembra.

Além disso, ela também sentiu o impacto de ficar longe do Instagram nas suas relações pessoais. “Afetou um pouquinho o meu relacionamento com as pessoas porque 90% dos assuntos que a gente conversa, que a gente vive hoje em dia são pautados no que tá em alta na mídia, a vida meio que tá girando em torno das redes sociais. E quando eu me vi sem esse meio de informação, podemos dizer assim, foi uma coisa que afetou minhas relações”, compartilha. 

Praticamente “isolada” das redes sociais, Pietra foi descobrindo o prazer em viver mais livre delas, à medida que também sentia que esta ausência poderia prejudicá-la, principalmente no trabalho. “As atualizações foram chegando, as trends foram chegando, e eu fiquei um pouco perdida, porque eu não sabia o que estava acontecendo, o que estava em alta. Então me prejudicou, sim, de certa forma, não de forma grandiosa, mas eu me senti um pouco prejudicada por eu estar offline e acabar perdendo o time de algumas coisas que poderia agregar no meu profissional”, destaca. 

Com as redes sociais sendo cada vez mais uma ferramenta de trabalho, estar fora delas acaba causando este sentimento de “ficar para trás”, quase como viver desconectado não apenas do mundo virtual, mas da realidade também. Em um país onde 70,3% da população utiliza redes sociais, não estar presente nelas, é considerado por muitos, quase como não viver. Afinal, se você não posta, será que você realmente está vivendo? Tomado por essa reflexão, há dois anos o jornalista Matheus Maia resolveu que se afastaria do Instagram. “As redes sociais estavam tomando muito tempo da minha vida, me fazendo perder o foco de coisas que realmente importavam. Também resolvi me afastar pra poder ter novamente a sensação de como era a vida sem precisar ter que postar tudo nas redes sociais”, explica. 

Matheus Maia. Foto: reprodução.

Apesar de ter voltado a usar as redes sociais depois de um tempo, Matheus reconhece os benefícios do distanciamento e não descarta a possibilidade de viver offline novamente. “O mundo real é bem mais atraente que o mundo virtual e não quero ter que sentir a necessidade de tudo o que eu for fazer ficar postando nas redes sociais, como algumas pessoas fazem. Consegui colocar mais foco nas minhas atividades profissionais e pessoais. Sinto que as redes são boas até certo ponto, pois querendo ou não elas tem o poder de nos informar rapidamente de acontecimentos, mas precisamos dosar bem o tempo de uso das redes sociais, pra não ficar dependente delas nem para perder tempo que poderia ser gasto em trabalho ou estudos”, reflete. 

Com histórias que podem representar muitas pessoas, os três jovens têm em comum o reconhecimento de que é preciso entender às próprias necessidades e identificar quando algo, que pode ser benéfico, não está fazendo bem. Para além do reconhecimento, é preciso ter a coragem de se afastar, sabendo também que por mais tecnológico e virtual que o mundo esteja, as experiências no mundo real acontecem a cada segundo que nos propomos a viver sem a barreira do engajamento. Acima de tudo, viver sem nunca esquecer que, sim, existe vida fora das redes sociais.

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