Há um tempo, em um dos incontáveis dias de quarentena, uma tia comentou comigo que havia “um silêncio no mundo”. No momento eu concordei, mas depois me peguei pensando em que silêncio era aquele. Na verdade, acho que a constante tentativa de preencher meus dias com atividades e mais atividades, não me dava muito tempo para ter uma reflexão como aquela que ela tinha me colocado.
Alguns dias depois, enquanto fazia um trajeto por uma estrada conhecida,comecei a ouvir o tal silêncio. O percurso que costumava ter tantos passageiros, agora ,mal era frequentado. O mato estava alto quase invadindo a pista e uma enorme lua cheia era a única acompanhante de quem passava por ali. Longe de casa e indo para um destino que me causavam inúmeras incertezas, o meu silêncio interno competia com o do mundo.
Os dias foram se passando acompanhados pela inquietude que provavelmente duraria meses. O sol nascendo e se pondo, mas da janela ainda era possível avistar inúmeras pessoas que pareciam manter sua “vida normal”. Carros, motos e pessoas vinham e sumiam novamente na escuridão. Foi quando descobri o verdadeiro silêncio do mundo.
O silêncio estava sufocado em meio ao barulho de pessoas que preferiam ignorar tudo ao redor, em meio a brigas sem fim e em meio a incapacidade de respeitar a dor do outro.O silêncio mais ensurdecedor de todos era aquele que insistia em transformar pessoas em números. O silêncio no mundo era a indiferença.
Enquanto muitos faziam textos gigantes sobre tudo o que o vírus ensinou para a humanidade, eu sabia que ele não ensinou nada. Pelo contrário, trouxe à tona o que sempre esteve dentro das pessoas. O vírus substituiu as máscaras.
As pessoas viraram manchetes, mais um jovem foi morto, mais uma pessoa não teve suporte e mais uma vez o ser humano revelou seu egoísmo. Até quando faremos silêncio diante de uma realidade tão perturbadora?
