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Cadernos

 

 

 

 

 

Ouvindo Toquinho, passei a pensar em meus cadernos. Confiava a eles os maiores segredos que uma criança de 8 anos pode ter. Tive um que escondia na minha gaveta de calcinhas, tendo a total convicção de que minha mãe não sabia de sua existência, mesmo eu sendo criança. E para mim ela nunca poderia saber, pois queria que meus segredos continuassem sendo secretos. Tive um que era trancado a chave, mas não precisava da chave para ser aberto. Eu não sabia disso na época. Outro que tinha cheirinho de morango, e as vezes eu o abria só para sentir. Tive um que só abria com o imã da pulseira que vinha combinando, era um dos meus preferidos, eu mal escrevia nele, mas gostava de o carregar por aí para mostrar pra todo mundo. 

Mesmo tendo vários cadernos, o ritual para mim era sempre o mesmo: toda noite eu conversava com ele e contava o meu dia, sempre chamando-o de querido diário, mas só depois que ele me permitisse. Tinha várias canetas coloridas que também tinham cheirinho, e a cada dia escrevia nas páginas com uma cor diferente, sempre tomando muito cuidado para não errar. Eu amava tanto meus diários que guardava sempre os adesivos grandes dos cadernos da escola para colar neles, tinha até às embalagens de achocolatado que havia tomado no dia, como se fosse uma espécie de scrapbook. Tudo eu colava neles, desde desenhos até folhas secas que eu encontrava no chão, tudo podia virar uma história. 

Lembro dos meus cadernos até hoje, e tive um pra cada época da minha vida. Quando fui crescendo, fui os deixando meio de lado, a escrita passou a ser de vez em quando, às vezes até esquecia da sua existência e me pegava lendo textos antigos que naquele momento já não faziam mais sentido. Os problemas da época, hoje, passam a ser pequenos, como a festa em que não pude ir ou a amiga que não passou o recreio comigo. O conteúdo passou a amadurecer, chorar a morte de um ídolo ou o primeiro namorado que não deu certo. 

Hoje comprei um caderno novo e não sei o que vou escrever nele, talvez daqui a alguns anos os problemas de hoje sejam pequenos, se comparados. É difícil de imaginar. Mas apesar de diferentes, todos os meus cadernos envolveram um sentimento em comum, a paz e a liberdade que a escrita me proporciona. Mesmo nunca tendo cumprido a promessa de Toquinho, eu a faço de novo: para meus cadernos, prometo não te esquecer em um canto qualquer.

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