“Cruzeiro encontra já, ao nascer, o arranha-céu, a radiotelephonia e o correio aereo: o esboço de um mundo novo no Novo Mundo. Seu nome é o da constellação que, ha milhões incontaveis de annos, scintila, aparentemente immovel, no céo austral, e o da nova moeda em que resuscitará a circulação do ouro. Nome de luz e de opulencia, idealista e realistico, synonymo de Brasil na linguagem da poesia e dos symbolos. Timbre de estrellas na bandeira da Patria, o cruzeiro foi, desde o primeiro dia da sua historia, um talisman.[…]”
A revista O Cruzeiro, inicialmente chamada apenas de Cruzeiro, foi lançada no dia 10 de novembro de 1928, sob direção do jornalista Carlos Malheiro Dias. O periódico semanal tratava de temas como cinema, culinária, moda, política, esporte e o estilo de vida dos astros hollywoodianos. O grande diferencial da revista eram suas ilustrações, tanto nas capas como nas matérias, que ficaram marcadas na história da imprensa brasileira.
O projeto inicial foi desenvolvido pelo próprio Carlos Malheiro, mas, por não ter capital suficiente para custear as edições, ele vendeu os direitos para Assis Chateaubriand, o Chatô, fazendo com que o periódico fosse editado pelos Diários dos Associados, umas das maiores corporações existentes na mídia brasileira.
Apesar de não ter sido responsável por colocar a revista para rodar, Carlos Malheiro continuou participando do projeto, sendo diretor da publicação durante os anos de 1928 e 1933. O trecho que abriu nosso perfil de hoje, foi retirado do editorial da primeira edição da O Cruzeiro, explicando a escolha do nome e o caráter inovador adotado pela publicação.
Esta inovação veio em uma série de fatores, entre eles a nova linguagem utilizada para construir a ponte de comunicação com os leitores, as grandes reportagens escritas ao longo das edições, as ilustrações gráficas, a consolidação da parceria repórter-fotógrafo, que possibilitou o amadurecimento do fotojornalismo brasileiro, e um quadro de jornalistas em tempo integral.
O conteúdo era inspirado em exemplares estrangeiros, com destaque para a revista norte-americana Life, mas nem tudo era inovador e fruto do trabalho dos profissionais envolvidos na produção do periódico. A revista O Cruzeiro também ficou conhecida por publicar contos, ilustrações e até mesmo seções inteiras, como a de moda, copiados de revistas estrangeiras sem dar os devidos créditos.
No entanto, também existiam as publicações autorais de bastante qualidade e dignas de prêmios, que foram, de fato, conquistados. A reportagem “Uma tragédia brasileira – os paus-de-arara”, de Mário de Moraes e Ubiratan de Lemos, foi vencedora do prêmio Esso de jornalismo, reconhecida pelo trabalho da dupla de jornalismo que se aventurou em uma viagem para acompanhar os nordestinos que enfrentavam condições desumanas nos paus-de-arara rumo ao Sul e Sudeste em busca de melhores condições de vida.
A revista também teve envolvimento na campanha política de 1929, que contava com as candidaturas de Getúlio Vargas, pela Aliança Liberal, e Júlio Prestes, indicado por Washington Luís, presidente do Brasil na época. Dentro deste cenário político, Assis Chateaubriand apoiou a chapa de Vargas, com João Pessoa de vice, e se beneficiou do investimento financeiro da Aliança Liberal, importando impressoras de rotogravuras, para impressão da revista O Cruzeiro, expandindo o portfólio dos Diários dos Associados com a compra do O Estado de Minas, jornal de Minas Gerais, e o lançamento do Diário da Noite, no Rio de Janeiro.
O apoio a Getúlio e João Pessoa ficou claro pelas páginas dedicadas a cobertura política da candidatura deles em contrapartida ao pouco espaço disponibilizado a Júlio Prestes. Durante o desenrolar do cenário político da época, a revista dedicou grande espaço para a cobertura do assassinato de João Pessoa, em um café de Recife, e foi fundamental na oposição ao governo de Júlio Prestes, recém-eleito.
É fato que a revista O Cruzeiro construiu sua história em meio a aventuras jornalísticas, cobrindo temas como a vida indígena, a própria imigração, os personagens da política nacional e também manifestações artísticas da cultura popular. Esta trajetória, costurada pelo fotojornalismo, colocou o periódico na galeria de destaques da imprensa brasileira.
A revista ficou em circulação entre os anos de 1928 e 1975, quando foi a falência. A decadência não foi instantânea, mas um processo marcado pela diminuição na venda de exemplares e o aumento da concorrência, representada pelas revistas Manchete e Fatos & Fotos.
O acervo digital da revista O Cruzeiro pode ser encontrado na Biblioteca Nacional Digital Brasil, no link https://bit.ly/3nh20TL .