Ok, essa é uma série de difícil digestão. Levei mais dias para terminar seus dez episódios do que costumo levar para devorar temporadas inteiras. A trama promoveu-me um desarranjo emocional de forma tal que ainda posso sentir o sal das lágrimas que verteram-me dos olhos ao final da última cena.
Maid, série da Netflix, conta a história de Alex (Margaret Qualley), uma mãe de 25 anos que chega a desesperada decisão de fugir no meio da noite com sua filha de 2 anos, Maddy (Rylea Nevaeh Whittet), em uma tentativa de escapar do comportamento agressivo de Sean (Nick Robinson), seu namorado e pai da criança. Desamparada, Alex recorre a programas governamentais, sendo acolhida por um abrigo para mulheres vítimas de violência doméstica. Como forma de subsistência, a jovem recorre à ocupação de faxineira, trabalho que lhe possibilita prover o mínimo à sua filha.
A trama nos revela que Alex advém de um complicado contexto familiar, realidade que consubstancia seus traumas. Sua mãe, Paula (Andie MacDowell), instável de intenções, figura-se em mais um elemento na cadeia de aflições da protagonista. E o pai, Hank (Billy Burke), ausente, é um fiel retrato da negligência emocional paterna que corre nas veias culturais. Vai se delineando, então, a posição de absoluta fragilidade em que Alex se encontra, a partir da qual se desenrola uma série de implicações e ramificações.
Fato é que Alex sonha ser escritora. No trabalho, ela passa a observar as gavetas, arranjos e dinâmicas das casas que limpa, anotando suas impressões em um caderno. O potencial de seus escritos é expressivo, mas sua condição nebulosa de luta por sobrevivência e a violência psicológica a impedem de trazer à luz esse desejo. Deparar-me com essa circunstância foi terrivelmente triste. Pensei em Virginia Woolf, que no ensaio “Um Teto Todo Seu” já nos dizia: “(…) uma mulher precisa ter dinheiro e um teto todo seu, um espaço próprio, se quiser escrever ficção.” Foi com Woolf que aprendi que, para uma mulher, a possibilidade de explorar e viver a própria subjetividade se apresenta somente com um teto todo seu. Alex, portanto, pensei: só vai ser escritora quando conseguir um teto.
E é isso que Alex busca. É para essa condição física e existencial que Alex corre, com toda força e coragem que consegue reunir, organizando sua energia na tentativa de quebrar o ciclo de violência que habita, com o amor pela filha orientando suas ações mais otimistas. Como espectadora, coube a mim torcer para que, ao final do episódio, ao menos uma coisa tenha dado certo para ela. Coube a mim a tristeza ao pensar que, na esfera da vida real, as vezes não dá certo. Nada. Para tantas. Mas à Alex coube uma mensagem de esperança.
Toda a trama se ampara em uma perspectiva social. A série é uma porrada de realidade em nossos estômagos que tem o peso e a dor das doenças sociais que aborda. Maid nos dá diagnósticos. O remédio? A cura? É um longo caminho. Mas podemos partir daqui:
Entenda o diagnóstico. Atente para os sintomas. Indique essa série para um homem. E você, mulher, cuide daquelas ao seu redor.