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Da rua ao palco de teatro, o Coletivo Camaleão expressa suas transformações dando ainda mais cor a arte

 

 

 

Integrantes do Coletivo Camaleão da cidade de São João del Rei (MG). Foto: reprodução

 

 

 

 

 

 

 

O camaleão é um animal que representa a flexibilidade e a capacidade de adaptação de acordo com o ambiente onde está inserido. Já na arte, o termo é utilizado para caracterizar bons atores, capazes de interpretar com perfeição ao vestirem “novas peles”. No perfil dessa semana do Mural da Ana Paula, você conhece um conjunto de camaleões que têm feito jus ao significado artístico da palavra. 

O Coletivo Camaleão foi formado em 2017 por um grupo de estudantes de teatro em São João Del Rei (MG) e nasceu como um espaço de experimentação para criar coisas novas, entre elas trabalhos independentes, que não ficassem limitadas apenas aos muros de uma universidade. Foi assim que um grupo de jovens encontrou um espaço para se formarem enquanto produtores de arte. 

Atualmente o Coletivo Camaleão é formado por seis integrantes: Abraão Lavor, Halina Cordeiro, Jhonny Azevedo, Natalia Carolina, Valéria Freitas e Talles Ramon. Apesar de terem se unido em uma cidade no interior de Minas Gerais, eles vieram de diferentes estados do países e se conectaram por algo em comum: a necessidade de fazer arte. 

As funções dentro do grupo acabam sendo assumidas por todos, mas alguns costumam ficar com mais frequência em determinados setores de acordo com suas habilidades. Como por exemplo, a Halina Cordeiro assume a parte de figurinos, o Jhonny Azevedo propõe exercícios voltados para o lado musical e o Abraão Lavor fica com a coordenação das atividades. 

Com três anos de existência, o Coletivo Camaleão já teve a oportunidade de levar um pouco de si através de cenas, performances e oficinas para muitos lugares, como Paraopeba, Santa Cruz de Minas, Perdões, Barroso, Palmital, Padre Brito, Icó e Lima Campos. Os dois últimos locais ficam no Ceará, um pouco longe do estado de origem do Coletivo, Minas Gerais. 

Para chegar até o nosso Ceará, o coletivo percorreu mais de 1.988,1 km de ônibus, lidando com os desafios de atravessar o país trazendo junto os materiais que precisariam para as apresentações, incluindo objetos cênicos e figurinos. A escolha de Icó, cidade no interior do Ceará, não foi aleatória, dois integrantes do Coletivo, Abraão Lavor e Valéria Freitas, são da cidade e foram para Minas Gerais para estudar teatro. Na breve volta para casa, eles encararam um antigo conhecido: o palco do Teatro Municipal da Ribeira dos Icós, um importante prédio histórico da cidade conhecida como a Princesa do Sertão. “Quando caiu a ficha de que isso ia realmente acontecer fiquei pasma, era difícil acreditar que a gente ia conseguir levar todo mundo pro Icó. […] Mas foi uma experiência incrível e foi o momento que eu tive mais certeza de que tenho que estar no Icó e compartilhar tudo que aprendi estando fora. Pode ser algo clichê, de uma artista que sonha demais, mas da mesma forma que a arte me transformou eu quero levar isso para outras pessoas, da minha cidade, onde tudo começou.”, compartilha Valéria.   

O Coletivo foi para o Icó para participar do Icozeiro, um festival cultural que acontece na cidade todos os anos no mês de dezembro, reunindo artistas das mais diversas áreas de atuação para exporem seus trabalhos. Uma das apresentações que o Coletivo Camaleão fez foi a peça “O Mundo Depois do Arco-íris”, criada a partir de uma improvisação que acabou resultando em algo mágico para quem tem a oportunidade de assistir.

Jhonny Azevedo atuando no espetáculo O Mundo Depois do Arco-íris

Para chegar ao resultado apresentado ao público, os integrantes passaram por uma construção coletiva, onde todos compartilhavam textos, músicas e propostas de cenas. “Foi um processo que foi sendo construído dia-a-dia na sala de ensaio, a partir das nossas experiências e vontades, que tem um pouquinho de cada pessoa que passou por ele. Além de nós, a Iasmim Alice, o Marcos Gonçalves e até a Gabi Ferreira contribuíram pra construção do espetáculo.”, afirma Abraão. 

O espetáculo também conta com uma parte musical que veio de inúmeras referências, entre elas o grupo Tiquequê, os espetáculos infantis do Teatro da Pedra (Grupo de Teatro Profissional de São João del-Rei) e algumas outras músicas infantis clássicas. “O fato das músicas serem tocadas e cantadas ao vivo, para mim, aproxima mais dessa magia que a gente propõe, facilitando inclusive a mobilidade, já que a gente não precisa de equipamentos técnicos pro espetáculo acontecer.”, reforça Valéria.

Depois de apresentarem “O Mundo Depois do Arco-íris” tanto na rua como em palcos de teatro, o Coletivo chegou a conclusão de que o espetáculo escolheu a rua como seu espaço. Para eles, isso tem muito a ver com a oportunidade de conversar com o próprio público e deixar que ele também faça parte da brincadeira.

 

Performance do Coletivo Camaleão na cidade de Icó (CE)

Além de “O Mundo Depois do Arco-íris”, o Coletivo Camaleão também tem as performances “Corações Poetas” e “Identidade”. Em “Corações Poetas” o objetivo é “Color(ir) e ocupar espaços com ações poéticas”. Durante a apresentação, o Coletivo propõe que as pessoas parem um pouco a correria do dia-a-dia e olhem para o que está ao redor, descobrindo novas maneiras de ocupar um ambiente que já é conhecido. Para Natália Carolina a performance “[…] é muito um encontro da gente com o lugar que a gente vai. Ela muda de acordo com a cidade, nunca é a mesma coisa, porque ela vai acontecendo a partir da nossa relação com o espaço, com as pessoas que estão lá, com a história do lugar. É muito absorver do lugar e devolver coisas.”, enfatiza.

Em “Identidade” a rua também é o palco do espetáculo e no ambiente onde as pessoas estão cercadas “por elementos que compõem uma suposta identidade coletiva, cultural e social, as palavras são substituídas por ações e tintas”. Ou seja, a ideia é colorir e abrir um espaço para arte transbordar individual e coletivamente. Para Johnny Azevedo, a performance é “uma possibilidade de inserir pessoas da cidade que a gente está no nosso trabalho. Ela é mais interessante quando vem com o Workshop que a gente propõe, porque as pessoas têm a oportunidade de transpor suas identidades na sua própria cidade, se mostrarem enquanto artistas.”, complementa.

Por trás das apresentações vistas pelo público, o Coletivo encara um outro desafio: a montagem de figurinos. Sem verba e sem apoio vindo da Universidade, que não oferta aulas de figurino, a criação das peças fica por conta da criatividade. “O processo de criação é uma grande viagem na minha cabeça, vendo o que eu posso fazer com o que eu tenho, que contemple todo mundo do grupo e público também, mas é complexo e muito difícil. Principalmente por não ter dinheiro e não ter referências. Basicamente o que a gente tem para fazer figurino são coisas de brechó, quando tem um dinheiro, materiais reutilizáveis e coisas nossas, que a gente vai doando para o processo.”, comenta Halina Cordeiro, integrante responsável pela montagem dos figurinos. 

Além dos outros desafios comuns para quem tenta fazer arte no Brasil, no ano de 2020 uma nova barreira surgiu em escala mundial e a classe artística foi uma das primeiras a sofrer o impacto. Com a paralisação causada pela pandemia do COVID-19, as cortinas foram forçadas a baixarem e ainda não é possível visualizar quando levantarão novamente. Assim como boa parte dos artistas brasileiros, o Coletivo Camaleão também tem enfrentado as dificuldades trazidas pela período e outras que só entraram em maior evidência, como é o caso da falta de apoio cultural vindo do Governo.

Tendo que se virar da melhor forma possível, o Coletivo destaca as dificuldades de se adaptar para o virtual, a ausência do contato com o público e, claro, seguir produzindo quando tudo está um caos. Apesar dos lados negativos, o integrante Talles Ramon destaca que mesmo em meio as barreiras, a arte não parou. “Uma coisa que eu tenho percebido também, […] é que os grupos estão se movimentando, estão entrando em live, estão dialogando, o meio artístico tá se juntando pra conversar e ver possibilidades, porque todo mundo foi pego de surpresa.”, comenta.

Com a ajuda da tecnologia, o Coletivo Camaleão conseguiu se reunir novamente para levar seu trabalho ao público através da do evento Tudo em Casa – Fecomércio, realizado pelo Sesc-Ce. Nos dias 20 e 27 de julho, o Coletivo realizou duas lives onde vivenciaram um intercâmbio teatral com outros dois grupos o Grupo Arte da Ribeira e o Sinceratos de Teatro, ambos da cidade de Icó (CE). Durante as apresentações, o Coletivo Camaleão fez leituras dramáticas de algumas cenas do espetáculo “O Mundo Depois do Arco-íris” e também conversou sobre processos criativos com os outros grupos participantes. 

 

Coletivo Camaleão

Com um futuro incerto, diante de tudo o que tem sido vivido, o Coletivo Camaleão espera por dias melhores e reforça o propósito do próprio grupo. “No geral, a gente acredita que o Camaleão é um espaço de troca muito potente pra gente, enquanto grupo e artistas individualmente, e temos o interesse de manter essa rede de apoio não só entre nós, como também pra outros artistas, grupos e produtores culturais que admiramos, independentemente de onde a gente esteja. […] estamos dispostos a compartilhar sempre nossas pesquisas e interesses com quem estiver disposto a ouvir, onde quer que esteja, da forma que for necessário fazer. Seguimos resistindo, criando, dentro da realidade e limitações que nos foram impostas.”, concluem. 

Se você quiser conhecer mais sobre o Coletivo Camaleão, acesse o perfil deles no Instagram @coletivocamaleao e faça parte de uma rede de apoio a arte e a cultura mesmo em tempos sombrios. 

 

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