Helen Lavor nasceu em Iguatu, uma cidade de interior no centro-sul do Ceará, localizada a 369 km de Fortaleza, capital do estado. A caçula entre os três filhos de Francisca Lucivalda e José Alberto Lavor, ela teve uma infância de diversão com amigos e família, mas também marcada pela timidez. Apesar desta característica, a cearense sempre foi curiosa e tentava participar de tudo o que era possível, sondando até descobrir se gostaria de fazer determinada atividade.
No período de escola, a veia desbravadora fez com que Helen participasse, por exemplo, das aulas de capoeira ofertadas no local, mas ainda estava longe de ser sua verdadeira vocação na vida. Um dia, saindo mais cedo do treino, ela encontrou a irmã, que participava da banda da escola, e resolveu acompanhá-la até o ensaio. Logo que chegou, ficou encantada ao observar os instrumentos e as pessoas que se preparavam para usá-lo, o maestro, Francisco Prudêncio, mais conhecido como Mano, acabou se aproximando e perguntando se Helen não gostaria de tocar também, entregando uma pandeirola para que ela se juntasse aos outros.
Iniciando no instrumento de percussão, a menina foi se envolvendo mais com as rotinas da banda, participando de ensaios e apresentações, ficando mais cativada com o passar do tempo, até começar a almejar outros instrumentos, como o clarinete e o sax. A medida que foi sendo conquistada pela música, Helen também encarou novos desafios e decidiu tocar na banda da cidade, dirigida pelo mesmo maestro da sua escola. Na banda, ela começou a tocar trompete, estudando como podia e se dedicando fielmente até conquistar seu lugar na banda. “O maestro já me conhecia e sabia que eu era responsável, atenta, não faltava aos ensaios, etc. A banda de Iguatu foi o primeiro grupo onde eu realmente comecei a ganhar dinheiro, mesmo que pouquinho já era alguma coisa e abriu uma porta para mim. Eu tinha uma resposta financeira e foi lá que abriu minha cabeça para isso, foi a resposta de todo o tempo que eu passei de estudo, ensaio e dedicação.”, compartilha Helen.
Quando estava no ensino médio e próxima de decidir o que faria em seguida, a iguatuense não ficou isenta da pressão imposta pelas escolhas e chegou a cogitar o curso de Educação Física, já que sempre tinha sido muito envolvida com esportes. Mas, a música já a tinha escolhido antes mesmo que sua cabeça, ou coração, tomasse a decisão final. Neste mesmo período, a jovem fazia parte da escola de música Eleazar de Carvalho, onde aprendia música erudita, e foi convidada por Sônia Muniz, viúva do maestro, para tocar, juntamente com os demais membros da orquestra da escola, em São Paulo e no Festival Internacional Eleazar de Carvalho, em Fortaleza.
Para Helen, que nunca havia arriscado longas distâncias dos limites de Iguatu e cidades circunvizinhas, era como se estivesse começando a conhecer a mundo e ter experiências que mudariam toda sua trajetória. As vivências durante este período tornaram possível uma carreira na música. “Foi o ano que eu mais tive contato com músicos profissionais, não só na escola de música, mas também nas outras cidades que visitei. Foi vendo essas pessoas que eu vi que eu podia ser elas. Ia ser um pouquinho mais difícil por eu ser do interior, mas não era impossível.”, relembra.
Logo após a experiência, a escola Eleazar de Carvalho fechou as portas e os alunos começaram a debandar. Em meio ao momento de incerteza, Helen decidiu que era hora de começar agir. Decidida a batalhar por seu sonho, ela tomou a decisão de ir morar em São Paulo, deixando família e amigos para trás. O processo de adaptação não foi fácil, principalmente pelos impactos culturais e a distância de casa, mas a persistência, marca de toda sua história, fez com Helen permanecessem com os olhos fixos em seus objetivos. Em seguida, voltou para o Nordeste e foi morar em João Pessoa, Paraíba, onde concluiu o curso de Bacharelado em Música na Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Logo quando chegou na capital paraibana surgiu a oportunidade de fazer um teste para ingressar na Orquestra Sinfônica Municipal, na época ainda uma Orquestra de Câmara por ter um número reduzido de músicos. Apesar da concorrência, Helen fez o que sempre soube fazer de melhor, tentar, e desde de 2013 integra o núcleo de músicos da orquestra. Apesar de sempre ter focado em performance, Helen também agarrou a chance de ser professora de música e hoje ensina violino e viola na Escola de Música Anthenor Navarro, sendo exemplo para seus alunos da mesma forma em que um dia se inspirou em seus professores.
Apesar de hoje estar bem estabelecida em João Pessoa, Helen não descarta a possibilidade de voltar para seu estado natal e desenvolver projetos na sua área, a exemplo do próprio Eleazar de Carvalho que, mesmo após sua morte, teve o sonho realizado por sua mulher, que abriu a escola de música erudita em Iguatu. “Não importa onde a gente esteja, nosso coração sempre vai estar na nossa cidade natal. […] Têm muitos músicos cearenses espalhados pelo mundo e tenho certeza que o sonho deles é trabalhar em uma orquestra sinfônica do Ceará. Em Iguatu, eu gostaria muito de ter um projeto social, algo muito significativo na docência porque você dá um retorno para a sociedade. Você dá uma oportunidade de carreira, assim como foi dada para mim.”, compartilha.
O sonho de ser artista pode enfrentar a dificuldade do baixo incentivo cultural, principalmente na música erudita. O próprio estado do Ceará é um dos poucos que não possui uma orquestra sinfônica, praticamente obrigando que os músicas saiam para tentar carreira em outros lugares, uma realidade muitas vezes difícil de digerir.
A menina cearense nunca deixou os obstáculos ocuparem o lugar dos seus sonhos e leva como mensagem de vida a frase “por que, não? Por que, eu não posso?” para seguir persistindo e aconselha outras pessoas com o mesmo desejo de ser músico, “ você, mais do que qualquer pessoa, tem que acreditar na sua carreira e em você. Mantenha o foco e estude, as oportunidades vão aparecer e você tem que estar preparado para agarrá-las.”, reforça.
Hoje, se Helen Lavor encontrasse a menina tímida e curiosa que marcou sua infância, poderia olhar nos fundos de seus olhos e sorrir, dizendo, para sua versão mirim, que a caminhada valeu a pena.