Quem ficará no porto quando meu barco partir? Penso isso arrumando as malas para desbravar mares e continentes até então desconhecidos por mim. Os dizeres dos antigos náuticos atravessam o tempo pela frase do poeta Fernando Pessoa afirmando que “navegar é preciso, viver não é preciso” e assim vou seguindo como posteriormente o poema diz: na tentativa de criar-me.
Mas quem ficará no porto quando meu barco partir? Minha mãe, com toda certeza, entre lágrimas e acenos mostrando que o amor impulsiona sonhos. Minha cadela branquinha, latindo em si bemol, em tom de despedida. Talvez, meia dúzia de amigos que fiz dentre tropeços e acertos. Um grande amor? Acho que este ficará faltando, as amadas prevaleceram em suas casas e na minha memória, mas sem afeto na despedida.
Ainda assim, sigo questionando: quem ficará no porto quando meu barco partir? Não me refiro às pessoas já mencionadas, mas um ser tão importante na minha vida quanto todos eles. A pergunta poderia ser mais certa se pensasse em qual versão minha não embarcaria na naus e se despediria de um outro eu que decidiu ir. “Olhar para trás não é preciso” e seguir em frente é necessário, mesmo quando o passado pulsa no medo de não saber como será o regresso.
Provavelmente voltarei, se os mares ou os homens não me afogarem em vorazes tempestades, mas não quero prazos e sim sonhos. Enquanto tiver fôlego para respirar por mim e todos os outros que ficaram quando meu barco partiu. Aliás, digo também que comigo vieram em forma de sentimentos, desejos, arrependimentos e em tais horas a dor também ajudará a remar para outras terras, sendo estas agora minhas.
A cabeça e os pés são partes de um tempo que construo com as mãos diante do inesperado. Da estranheza de caminhar sozinho sem carregar a solidão que assusta quando se está cercado de pessoas erradas, esquecendo até o pulso do coração e esse, segundo um conterrâneo, é a maior bússola pois mostra onde nasce o sol.
Voltarei para rever todos os que ficaram no porto quando meu barco partiu, ainda que repleto de dúvidas: será que minha mãe sobreviverá a saudade da minha ausência? Minha cadela branquinha ainda reconhecerá meu cheiro? E os amigos eram tão fiéis que superaram a distância? Ao mesmo tempo em que penso quem descerá desta naus? Não sei, a única certeza é que ao reencontrar todos eles, vou entender que tudo mudou, inclusive o porto, o barco e eu.
Por Heitor de Almeida