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Onde andam os anjos da América?

Em Angels in America, Tony Kushner utiliza o surgimento e a disseminação da AIDS nos Estados Unidos como metáfora para um mundo doente e que se destrói, invariavelmente, à medida que avança. 

Publicada originalmente em duas partes, em 1991 e 1992, respectivamente, a peça chegou a vencer o Pulitzer e o Tony, e foi adaptada para a TV em 2003, sendo indicada para 21 Emmys e vencendo 11. Apesar de se passar em meados dos anos 80, Angels in America tem muito a nos ensinar sobre o pandêmico mundo no qual vivemos atualmente. 

A história se constrói a partir do diagnóstico de dois homens como portadores do vírus do HIV. Mesclando História e ficção, a trama se desenvolve unindo e separando pessoas, em alusão metafórica ao que a AIDS e o mundo do capitalismo moderno fizeram – e fazem – na sociedade.  Iniciando-se no ano 1985, no governo de Ronald Reagan, ideologicamente similar ao de Donald Trump e de Bolsonaro, Angels in America retrata o descaso de um governo com um pandemia que se alastra e rapidamente dizima uma população. 

Prior, um dos protagonistas, é diagnosticado com HIV e abandonado por seu companheiro. Roy Cohn é um famoso e inescrupuloso advogado que, apesar de ser homossexual, não se considera como o tal. É, ao seu ver, apenas “um homem que faz sexo com outros homens.” Por ser poderoso, não aceita o rótulo de homossexual. Roy é um reflexo da América: terminal, louco e mau. Também soropositivo, é o retrato simbólico das desigualdades sociais em um mundo onde só o dinheiro e o poder importam.  

É impossível descrever a magnitude desta obra que, infelizmente, continua visceralmente atual. É um retrato de almas torturadas, ignoradas e deixadas à mercê de um governo que não as reconhece. É violenta, crua e pulsante.

A adaptação televisiva faz jus à grandeza da obra. Com um elenco impecável, que traz astros como Meryl Streep, Al Pacino e Emma Thompson,  sob a direção de ninguém menos que Mike Nichols, Angels In America é uma obra necessária hoje e sempre. É um retrato de um mundo doente que cultiva suas mazelas, ao invés de lidar com elas. É um espelho da nossa decadência moral.  É o reflexo do descaso. É a maior obra televisiva já feita. 

Enquanto nós, como sociedade, não encararmos e lidarmos de frente com nossos problemas e deveres, não iremos para frente. É nosso dever aceitarmos a responsabilidade por nossas ações e o que tem nos levado ao colapso. É isso que Angels in America busca retratar: o abandono. Até por Deus, de acordo com um de seus protagonistas. “E se ele voltar, levem-o ao tribunal. Ele nos abandonou. Ele tem de pagar.” 

 

 

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