No começo de 2021, fiz uma reportagem sobre cuidados paliativos e o tabu da morte. Durante esse tempo, me vi aprendendo e absorvendo uma nova perspectiva sobre a morte e sobre a simplicidade da vida. O desenvolvimento, as tecnologias… todos esses novos apetrechos da atualidade nos fazem acreditar menos que somos mortais, que não existe forma de combater o tempo. Tempo é vida. E nós somos nós mesmo em cada instante que vivemos.
No processo de produção da reportagem, entrevistei uma especialista em tanatologia. Essa especialista lida com a morte como objeto de estudo e faz isso todos os dias. Em um momento da entrevista ela falou: “A morte faz parte da vida, faz parte da nossa construção enquanto humano e ela não é nossa inimiga.” Isso me faz refletir até hoje.
Na entrevista, a especialista contou que teve uma paciente adulta, que tinha um tumor num canto muito estratégico, se algo mudasse de lugar ela poderia morrer, e essa paciente costumava dizer: “hoje de tarde eu posso estar morta, mas até lá eu não estou”. E essa afirmação, vinda de alguém em estado de extrema fragilidade, é profunda demais. A gente aprende com essas pessoas que tudo está ligado a nossa vida, nós não precisamos estar perto de morrer para ter essa consciência que precisamos viver, porque um dia a gente vai morrer. A gente não precisa estar perto da morte para finalmente viver.
Mesmo assim, isso não quer dizer que a morte seja fácil de lidar, a morte não é fácil para ninguém, mas quando a gente entende que ela não é uma coisa a ser combatida, por não ser uma inimiga, mas algo que faz parte do ciclo da vida, tudo muda. Principalmente, no momento em que vivemos, precisamos lidar com a morte mais do que achávamos ser humanamente capazes. Perdas nacionais como Paulo Gustavo e, recentemente, Marilia Mendonça, expõem como é real a imprevisibilidade da vida.
A vida é uma incógnita e a morte é a única certeza que temos durante ela. Quando entendermos isso, conseguiremos falar sobre sem bater na madeira.