Querida moça da mesa 7, estou te observando a um tempo.
A melancolia que escorre de você me tomou a atenção e eu não pude evitar reparar em teus olhos céticos e na emoção insondável que lhe desenha o rosto. Há muros erguidos ao seu redor. Mas eu posso ver através das rachaduras.
Eu vejo a ansiedade presa na tua mandíbula. Vejo a fadiga dos dias na tua postura desacreditada. Quase posso ouvir as lamentações que você carrega nos lábios. E a essa altura, eu não sou capaz de parar de te olhar.
Há algo de extremamente charmoso no modo como as linhas se formam na sua testa enquanto você entrega sua concentração ao centro dos seus pensamentos conturbados. Você transporta uma espécie de vulnerabilidade refinada, dessas que instigam o aprofundamento de quem te olha a superfície.
Caramba, eu penso, como podem ser bonitos os momentos de fragilidade.
Agora você me encara por baixo dos cílios compridos, mas você não me vê. Olha apenas para o lado de dentro, tão recolhida em seu interior que os músculos do seu rosto mal se movem. Me sinto ligeiramente satisfeita por seus olhos acharem que eu seria um bom lugar para ancorar. Eis o momento em que nossos olhares se descobrem, mas só eu estou presente nesse encontro. Aqui, onde nossos tempos se deitam sob a mesma atmosfera ruidosa, e o espaço que nos separa é o mesmo que nos une.
Se estivéssemos em um filme, provavelmente me levantaria e iria até sua mesa. Iniciaríamos uma conversa qualquer e até o final da noite eu já teria desvendado cada uma das tuas fugas. Mas essa é a vida real, distante do desembaraço da dramaturgia. Então aqui eu permaneço, com as palavras presas no céu da boca e as perguntas que não chegam à língua.
Que barulho o teu silêncio carrega?
Você olha para trás fitando a rua a espera de algo que não tem intenção de chegar.
Em que espera você estacionou?
Qual o endereço da tua dor?
Pra onde você foi enquanto estava aqui?